sábado, 23 de julho de 2011

Experiência psicológica e Experiência Filosófica




A verdade é que caminho sempre entre a banalidade feroz do cotidiano e aspiração avassaladora de torná-lo nobre, de encantá-lo, de modo a poder superar o transcorrer de um tempo que resultará, ao cabo de meus dias, numa futilidade que desde já me desautoriza qualquer estímulo para a vida.

Perceber as coisas dessa maneira só é possível a nós, contemporâneos, pela circunstância de terem-se esvaziado nossos referências de valor e nossas certezas no que concerne ao significado último do fato de se estar vivo.

Como proceder e reagir aos estímulos que agora se mostram parcos, não raro incapazes de nos fazer elevar nossas vilezas a níveis de experiência de criação e significado? Ocorreu-me uma via de salvação, que espero poder nos apontar a travessia de uma experiência psicológica simples a foros superiores de criação, reflexão e crítica. Ei-la:

A experiência psicológica, entendida aqui como sensações e afetos permeados de linguagem, pode ser alçada pelo sujeito à condição de experiência filosófica. Tal processo requer que o conteúdo da experiência se conduza, por operação do sujeito, ao interior da história da filosofia. A atualidade da experiência - sua filiação inexorável ao tempo presente – há que ser afirmada com veemência, sob pena de não poder haver criação de si em sentido pleno.

Aquele que vive, à guisa de exemplificação, uma situação eventual de decepção, tem algumas possibilidades diante de si. Em primeiro lugar, há respostas consumadas, terminadas, no mercado especializado de que dispomos.

O sujeito que prescinde desse primeiro e imediato recurso, pouco dispendioso e por isso “sedutor”, estará à volta com sua própria exigência de sofisticação ou qualidade, quando não à volta com a necessidade de fazer jus à sua condição de ilustrado.

Cumpre, neste último caso, elaborar a decepção e, nas palavras de Hannah Arendt, “contar uma história sobre isso”. É justamente essa narrativa da experiência, vivida na contextura ordinária do cotidiano, que se vê diante da possibilidade de se inscrever no campo filosófico, o que lhe daria condições de se investir de cunho político. A experiência individual se nos afigura, dessa forma, a origem mesma de uma prática individual ou coletiva de libertação.

Pormenorizando a exemplificação, a decepção advinda de um desencontro amoroso pode levar o sujeito a questionar e elucidar a constelação afetiva que envolve a expectativa e sua frustração. Apresenta-se, em seguida, o desinteresse do outro como o problema que mais afeta o sujeito malogrado. O imperativo do desagravo, característico do ressentido, pode dar lugar a uma crítica das condições reais, concretas e atuais do desencontro. Por fim, o próprio enamoramento transforma-se em problema.

Tal problematização, tendo feito seu ingresso na história do pensamento e dialogado com outros pensadores, oferece ao sujeito o ensejo a uma crítica de si, do sistema, de seus condicionantes e, em casos especiais, da própria filosofia que se produziu alhures.

Da breve explanação, aponta-se uma alternativa à busca “ensandecida” de nosso tempo por respostas fáceis e imediatas.
Respostas que se compram, até mesmo literalmente, haja vista o próspero mercado que as sustenta e comercializa.

Tal operação também se torna uma via de elaboração e possibilidade de reivindicação de direitos por grupos e minorias, como a comunidade GLBT.



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